Em material, autor vê a China como “maior desafio” de seu país no século 21 e pondera como conter ascensão do rival.
“O mais importante desafio enfrentado pelos EUA no século 21 é a ascensão de uma cada vez mais autoritária China sob o presidente e secretário-geral do Partido Comunista, Xi Jinping”.
A frase abre o documento “The Longer Telegram“, de autoria anônima, divulgado pelo think tank Atlantic Council no fim de janeiro.
O título, “o telegrama mais longo”, em português, resgata o título de outro material, também publicado anônimo, em 1947. Naquela ocasião, os EUA esquadrinhavam sua estratégia de longo prazo para conter a rival União Soviética.
Bandeiras dos EUA (à esq.) e da China, em registro durante evento bilateral em Washington, nos EUA (Foto: USDA/ Lance Cheung)
O “Longo Telegrama”, publicado então na tradicional revista norte-americana “Foreign Affairs”, derivava de uma correspondência enviada de Moscou a Washington no ano anterior pelo diplomata George Kennan. À época, não foi divulgado o nome do autor, que assinou o texto com o pseudônimo “X”.
O material da revista, recheado de análises a respeito do governo soviético e ideias para uma contenção sem guerra, foi uma das principais linhas-mestras da estratégia norte-americana para a contenção da URSS.
A tática norte-americana, base da contenção praticada pelos EUA nas décadas seguintes, foi baseada em algumas das premissas de Kennan. Entre elas, que Moscou estava em “guerra permanente” com o capitalismo, a estrutura governamental na prática inibia uma visão real das ameaças internas e externas e as agressões vinham de um misto de “nacionalismo russo e neurose”.
O diplomata apostava afinal que as contradições inerentes ao sistema soviético terminariam por corroer por dentro o regime – o que se concretizou décadas mais tarde, com a dissolução da União Soviética em dezembro de 1991.
Contenção sem ruptura
Já o autor do “telegrama mais longo”, um suposto funcionário do governo norte-americano com anos de experiência na lida com a China, vê a situação de forma distinta.
No caso chinês, explorar as divergências dentro do Partido Comunista, sobretudo na cada vez mais oculta oposição ao presidente Xi Jinping, será fundamental. “É uma estratégia nada sofisticada tratar o [partido] como um único alvo monolítico”, afirma.
O objetivo seria enfraquecer o autoritário presidente Xi, que, na avaliação desse especialista, “retornou a China ao marxismo-leninismo clássico e fomentou um culto à personalidade semi-Maoísta”.
O presidente da China, Xi Jinping, é fotografado ao chegar na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2015, em Paris (Foto: COP Paris)
Ao contrário de seus antecessores Deng Xiaoping, Jiang Zemin e Hu Jintao, o atual mandatário reposiciona a China para tornar-se um Estado revisionista – ou seja, empenhado em modificar o status quo internacional à semelhança de seus interesses nacionais.
“Xi não é mais só um problema para a primazia norte-americana. Ele agora representa um problema sério para todo o mundo democrático”, conclui.
Para contrapesar essa força, é necessário entender os objetivos estratégicos de Xi. Entre eles, manter o Partido no poder a qualquer custo, fortalecer o Exército para conter adversários durante incursões no Mar da China Meridional e, no futuro, em Taiwan e investir numa relação de proximidade com a Rússia.
O atual governo chinês também mira a expansão de iniciativas como a do Cinturão e Rota, que realiza investimentos em países considerados importantes na consolidação de um bloco global pró-China.
Nas organizações multilaterais, o objetivo é paralisar qualquer política contrária aos interesses chineses. Em relação aos EUA, o governo age para suplantar a hegemonia norte-americana por meio de tecnologia de ponta e da diminuição do uso do dólar como principal moeda global.
O papel dos EUA
A estratégia norte-americana para lidar com a China nas próximas décadas exigirá uma “batalha ideológica mundial”, afirma. Para alcançar esse objetivo, os EUA terão contar com parceiros na Europa e na Ásia dispostos a defender o capitalismo liberal ante o modelo de Estado chinês.
Esse posicionamento dos EUA como principal contraponto à potência chinesa inclui recuperar a infraestrutura de tecnologia, economia, defesa e de capital humano norte-americana.
Será, porém, fundamental delimitar quais são as grandes ameaças à segurança nacional nas relações sino-americanas, segundo o autor. As mais graves devem ser entendidas como uma “linha que não pode ser cruzada” e assim serem comunicadas aos interlocutores chineses.
Ameaças moderadas devem vir acompanhadas de retaliações, que sirvam como sinalização de que os interesses dos EUA estão sendo prejudicados e o governo em Washington agirá para garanti-los.
Já “mega ameaças” como a pandemia do novo coronavírus, a proliferação nuclear ou a mudança climática exigirão um trabalho em conjunto dos dois países com a comunidade internacional.
Como conclusão, o autor enfatiza a necessidade cooperação norte-americana em longo prazo com o resto do mundo. Iniciativas combinadas entre os departamentos de Estado, Comércio, Tesouro e Defesa, além da agência de ajuda humanitária USAID, seriam a alternativa mais razoável para fomentar boa vontade de outras nações.
No cerne dessa política está uma estratégia de contenção chinesa por via da recuperação de longo prazo da confiança de parceiros históricos norte-americanos. Sem essa reconstrução, finaliza o autor anônimo, será difícil retomar e garantir a hegemonia do país na ordem mundial do século 21.
FONTE: UMA CONTRIBUIÇÃO DO SITE: AREFERENCIA.COM
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